A História do Super Famicom/Super NES, o 16 bits da Nintendo Parte 1: 1988
Sete empresas americanas e japonesas estavam comercializando sistemas de videogame em 1988. Como eles estavam se saindo? Eles tiveram pouco sucesso em prejudicar a participação da Nintendo no mercado americano e japonês, que era de 85% a 90%. A Atari vendia um punhado de seus defasados 5200 e 7800, e a Sega vendeu um total de 2 milhões de Master Systems. Uma quantidade considerável, mas muito pouco frente ao domínio do Nintendo Entertainment System. Outras empresas venderam muito pouco para serem citadas.
A indústria havia falhado miseravelmente em quebrar a hegemonia da Nintendo na terceira geração de videogames. Rumores de novos sistemas mais modernos e com hardware mais poderoso começam a surgir no horizonte. Eles estavam apostando na óbvia vulnerabilidade da Nintendo: seu sucesso. Porque? Naqueles dias a Nintendo mandava, e assim sendo, ela sentia-se confortável em sua posição inabalável. Ela ainda arrecadava grande parte de sua fortuna de desenvolvedores licenciados de softwares. Se a empresa planejava lançar um novo sistema, as desenvolvedoras rapidamente perceberiam a obsolescência do sistema NES, e a mudança poderia precipitar uma quebra precoce de seu esquema lucrativo. A Nintendo não queria perder uma de suas maiores armas: softhouses cativas e a garantia de bons jogos… e bons lucros.
Rapidamente a Nintendo começou a sofrer de um mal-estar típico dos líderes. Gorda e feliz, ela era levada por uma sensação de invulnerabilidade. Hiroshi Yamauchi, presidente da Nintendo do Japão e Minoru Arakawa, sua contraparte americana, sentiram que não precisavam reagir aos concorrentes. Afinal de contas, eles eram “a Nintendo”. Isso quase se mostrou um erro fatal!
A Nintendo começou a notar um pequeno zumbido em seu ouvido quando a NEC, uma gigante japonesa dos computadores e comunicações, entrou no mercado de videogames. A NEC tinha potencial para se tornar um devorador voraz! Com US$ 22 bilhões em vendas líquidas anuais, a empresa era sólida e bem administrada. A cada ano, ela investia 16% de suas vendas líquidas em pesquisa, desenvolvimento e programas de engenharia, com uma receita de US$ 3,7 bilhões em 1988 - mais do que qualquer uma das vendas líquidas anuais da Nintendo até 1992.
Yamauchi passou a ver a NEC como uma ameaça potencial por causa de seu negócio de semicondutores; em outras palavras, a empresa tinha uma fonte direta e barata de chips. Mais importante, a NEC tinha a reputação de manter uma visão de longo prazo. Apoiado por seu tamanho e recursos substanciais, ela poderia travar uma luta prolongada e implacável por qualquer mercado que desejasse. Yamauchi começou a se preocupar. Ele sabia que o Famicom já era um sistema com quase 5 anos no mercado.
Para impulsionar seu primeiro sistema de videogame, a NEC formou um grupo de entretenimento doméstico e lançou o PC Engine no Japão em 30 de outubro de 1987 e foi um tremendo sucesso. O PC Engine tinha um design elegante, menor em comparação com seus rivais. Juntamente com uma linha de software suportados por terceiros, como Namco e Konami, proporcionaram a NEC uma liderança temporária no mercado japonês. Um sistema mais caro foi lançado no mercado americano em agosto de 1989, renomeado de TurboGrafx 16, custando US$ 200. Era um sistema expansível, com capacidade de processamento de 16 bits na tela. Mas porque a NEC decidiu colocar uma especificação técnica no nome do seu produto americano?
Por muito tempo, as crianças, que compunham os principais jogadores de videogames, bits e bytes eram apenas termos ligados a computadores, com pouca ou nenhuma conexão com seus aparelhos prediletos. Então a NEC deu o primeiro tiro na guerra dos bits. O TurboGrafx 16 tinha o dobro de bits que o Nes, e as crianças começaram a aprender que mais bits significavam jogos mais realistas, com melhores gráficos e mais cores brilhantes, além de efeitos sonoros mais impressionantes. Seriam jogos com qualidade de fliperama.
“A versão americana do japonês PC Engine, o Turbografix 16 da NEC, tem toda a beleza do seu irmão de 16-Bits e também uma ótima jogabilidade, combinada com uma biblioteca de jogos maior do que qualquer outro sistema de próxima geração. A NEC está se preparando para colocar sua máquina de jogos mais avançada, nas mãos dos jogadores de todos os lugares em setembro de 1989. Apresentando todos os fantásticos recursos gráficos e sonoros do PC Engine, a máquina está pronta para assumir a liderança nas guerras dos sistemas de 16 bits! O cérebro por trás deste incrível sistema é idêntico ao do NES, mas os magos da NEC aprimoraram o processador 6502 normal com um processador independente que permite ao sistema produzir imagens de fundo e personagens verdadeiramente deslumbrantes”. Electronic Gaming Monthly, Julho de 1989
O chip de computação principal, o microprocessador, roda tanto em computadores como em videogames. Um processador de 8 bits, como o que está no coração do Nintendinho e do Famicom, pode trabalhar com até 64.000 sequências de informações com oito caracteres (ou bits) por pacote. Cada bit é na verdade um impulso elétrico, simbolizados pelos números 0 e 1. O número 1 significa ligado; o número 0 significa desligado. Então o NES tem a capacidade de ler mensagens únicas, de até 8 bits por vez. Um processador de 16 bits tem a capacidade de ler mensagens feitas com o dobro de informações. Então ele pode "entender" e processar até 250 vezes mais mensagens.
Trocando em miúdos, uma máquina de 16 bits pode fazer muito mais, e muito mais rápido, do que uma máquina de 8 bits. Quando a NEC lançou o TurboGrafx 16, os jogadores de videogame ficaram impressionados com a sensação de sprites maiores e mais texturizados dos primeiros jogos. Aquilo era um salto visível na tecnologia dos videogames, e isso estava sendo relacionado diretamente com a capacidade computacional dos 16 bits. Então, as crianças e seus pais entenderam rapidamente: mais bits é igual a jogos melhores.
Havia, no entanto, uma falha nessa lógica do mais bits é melhor, por trás da nova tecnologia, e a NEC aprendeu a lição da maneira mais difícil. Embora seu poderoso sistema reproduzisse jogos com melhores gráficos e som, a NEC não havia melhorado seus jogos. Eles não eram tão divertidos. No final, os 16 bits da NEC não podiam competir com o "Tetris", "Super Mario Bros.", "The Legend of Zelda" e centenas de outros grandes jogos da Nintendo.
Ainda assim, a NEC obteve o apoio de algumas desenvolvedoras de software, e os técnicos do setor começaram a se empolgar com a tecnologia do TurboGrafx 16. Alguns que decidiram desenvolver para o sistema, descobriram, no entanto, que o TurboGrafx não passava de um videogame mais incrementado. A NEC anunciou seu sistema como uma máquina de 16 bits, mas na verdade, ela tinha um processador de 8 bits que foi aprimorado para emular 16 bits. A tecnologia tinha limitações severas. “Não era um verdadeiro sistema de 16 bits." Como os desenvolvedores não estavam dispostos a gastar mais tempo com a máquina, e a base instalada era relativamente baixa, em especial nos Estados Unidos, o TurboGrafx acabou por não receber uma grande quantidade de títulos de excelência. Enfim, a ameaça não era tão grande. Yamauchi relaxou.
Mas havia outra empresa japonesa no radar, tão insignificante na época que, por pouco, não foi nem avistada. Seu nome era Sega. Ela nunca foi uma ameaça para Yamauchi. Com valor de US$ 700 milhões e fundada, curiosamente, por um americano, e dirigida por um japonês persistente - tinha uma história bem-sucedida no mercado de fliperamas no Japão e nos Estados Unidos. Mas a Sega era aparentemente pequena e especializada demais para entrar no mercado de consumidores da Nintendo. A Sega lançou o Master System como concorrente do Famicom e do NES, mas nunca ganhou mais de 5% do mercado. Embora, ao contrário da NEC, fosse muito competente na criação de software, não parecia estar jogando na mesma liga que a Nintendo.
“Entre outras novidades de console, o Sega Mega Drive de 16 bits estreou no Japão durante o último mês de 1988 com ótimas críticas. Enquanto os gráficos nos primeiros lançamentos não são tão extraordinários, a unidade como um todo é extremamente jogável, com som de dez canais que é absolutamente inacreditável!... Há rumores de que o Nintendo 16 Bit Super Famicom foi terminado, mas as fortes vendas do Nes e uma dolorosa falta de software estão adiando as datas de lançamento oficial. Aguarde mais novidades em setembro de 1989 no Japão…” Electronic Gaming Monthly, Julho de 1989
Yamauchi subestimou a Sega. Mas a Sega tinha uma diferença primordial da sua rival NEC. Seus executivos entendiam a importância do software para impulsionar as vendas do hardware. O Gênesis foi o primeiro sistema de videogame dedicado alimentado por um verdadeiro processador de 16 bits; ele tinha o mesmo processador Motorola 68000 que rodava nos computadores Apple Macintosh. A Sega simplesmente pegou o design de sua placa de fliperamas, a System 16, e a adaptou para o Mega Drive, Gênesis. Ele poderia, portanto, apresentar não apenas recursos de 16 bits, como gráficos e animação de alta definição, mais um espectro muito mais completo de cores (mais de 500), dois fundos com rolagem independente, que criava um impressionante campo de profundidade com ilusão de três dimensões, e som com qualidade quase de CD. O Mega Drive foi lançado em 29 de outubro de 1988 no Japão e chegaria em 14 de agosto de 1989 no mercado americano, juntamente com um catálogo de softwares de sucesso dos fliperamas da Sega. Como um periférico para o Gênesis, a Sega também lançou uma unidade chamada Power Base Converter. Por US$ 35, era possível que jogos do Master System fossem jogados no Gênesis.
A Sega conseguiu um distribuidor respeitável na América, a gigante dos brinquedos Tonka, gastou US$ 10 milhões em publicidade e partiu para derrubar o Golias. A máquina, com preço original de US$ 199, foi lançada nos Estados Unidos com base em títulos de software que as crianças que frequentavam os fliperamas já conheciam. A Sega atacou a Nintendo de frente. "Sega Genesis faz o que o Nintendo não faz", dizia o slogan.
Qual seria a reação da Nintendo? O que a Big N faria frente seus novos rivais que dispunham de maior poder de processamento e capacidades audiovisuais superiores? Seria o momento de revelar seu novo hardware, e relegar a um segundo plano seu 8 bits?